Sementes Patenteadas: O Novo Colonialismo Agrícola Como a Syngenta e a Monsanto transformaram o que era comum em propriedade privada
Há palavras que carregam peso histórico: "colonialismo" é uma delas. Evoca imagens de territórios ocupados, culturas exploradas, recursos saqueados. Mas, no século XXI, o colonialismo não vem em navios nem com bandeiras — chega em embalagens lacradas, com selos de patente e um contrato de licenciamento. E o território a conquistar? As sementes. Hoje, a semente deixou de ser um bem comum — passou a ser um produto corporativo protegido por leis internacionais. No centro desta nova forma de domínio estão duas potências: Monsanto (agora Bayer Crop Science) e Syngenta.
O fim da semente livre Durante milhares de anos, as sementes eram guardadas, trocadas, melhoradas pelos agricultores. Faziam parte da herança viva da agricultura, adaptadas localmente às condições do solo, do clima e da cultura alimentar de cada povo. Era um sistema circular, regenerativo e, sobretudo, livre. Mas com o avanço da engenharia genética e das leis de propriedade intelectual, as sementes tornaram-se alvo de patenteamento. Hoje, quem usa sementes transgénicas da Monsanto ou da Syngenta assina contratos que proíbem a sua reutilização, obrigando os agricultores a comprar novas sementes todos os anos. O ciclo natural da agricultura foi quebrado. Em seu lugar, instaurou-se um ciclo de dependência.
Patentes: a nova arma de controlo A Monsanto foi pioneira em registar patentes sobre características genéticas específicas — como a resistência ao herbicida glyphosato (presente no Roundup). A Syngenta seguiu caminho semelhante, apostando em sementes resistentes a pragas e doenças, através de modificações genéticas complexas. Ambas recorreram ao sistema legal para proteger os seus "investimentos" — o que, na prática, significa processar agricultores que reutilizam sementes sem pagar. Em muitos casos, mesmo quando a contaminação ocorre de forma acidental (por cruzamento natural com campos vizinhos), os agricultores podem ser processados por violação de patente.
Dependência disfarçada de inovação A promessa das sementes modificadas era simples: melhores colheitas, menos perdas, menos pesticidas. Mas a realidade no terreno tem sido mais sombria. Eis o que tem acontecido em muitos países:
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Agricultores abandonam variedades tradicionais para adoptar sementes "melhoradas" — e perdem autonomia.
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As culturas transgénicas exigem uso de químicos específicos (como o herbicida associado à semente), criando um pacote fechado de consumo.
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Quando os solos começam a empobrecer ou as pragas se tornam resistentes, os agricultores precisam de novos produtos da mesma empresa, alimentando um ciclo sem saída.
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Pequenas explorações tornam-se economicamente inviáveis, pressionadas por custos crescentes e colheitas uniformes.
O que era vendido como liberdade tecnológica, rapidamente se revela como um contrato de submissão económica e biológica.
Colonialismo Genético: o Sul Global como laboratório América Latina, África e Sudeste Asiático tornaram-se campos de teste privilegiados para estas multinacionais. Milhões de agricultores, muitas vezes com baixo acesso à educação formal ou a apoio técnico, são aliciados com promessas de colheitas abundantes e “resolução de todos os problemas”. Mas quando os problemas surgem — como a degradação dos solos, o aumento das pragas ou o endividamento — as soluções são mais produtos da mesma empresa. É um ciclo fechado, onde quem produz os alimentos raramente controla os meios de produção. A soberania alimentar é trocada por contratos de licenciamento. A diversidade agrícola, por uniformidade genética.
Portugal e Europa: território de resistência (por agora) Na União Europeia, a introdução de OGMs (organismos geneticamente modificados) é muito mais regulada. Em Portugal, o debate é aceso — e, até ao momento, existe alguma resistência à total liberalização das sementes transgénicas. No entanto, a pressão é real. Lobbying, campanhas de desinformação, acordos comerciais e alianças estratégicas estão a enfraquecer os mecanismos de protecção. A presença de sementes híbridas (não necessariamente transgénicas, mas igualmente patenteadas) já é significativa, e muitos agricultores já dependem de sementes importadas e produtos associados. A questão não é se esta forma de dependência chegará — é quando, e com que força.
✊ O direito à semente é um direito humano Por trás de cada patente está a tentativa de controlar a vida. A semente, enquanto símbolo de regeneração, biodiversidade e herança cultural, não pode ser tratada como propriedade privada. Recuperar a soberania sobre as sementes é um passo essencial para uma alimentação mais justa, resiliente e verdadeiramente sustentável. Organizações como a Via Campesina, a Navdanya (liderada por Vandana Shiva) e diversas cooperativas agrícolas locais, lutam para preservar, cultivar e distribuir sementes livres, adaptadas aos ecossistemas e às necessidades reais das comunidades.
???? Em nome da semente livre O que está em causa não é apenas o que comemos, mas quem decide o que podemos comer — e como. É um debate sobre poder, ética, justiça intergeracional e a própria relação entre humanidade e natureza. Porque se perdermos o direito à semente, perdemos também o direito ao futuro.
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